ONU atuará para que tragédia de Brumadinho seja lembrada
Parlamentares acompanharam visita de comissário da ONU a Brumadinho - Foto: Ricardo Barbosa

Familiares de vítimas pedem reforço nas buscas em Brumadinho

Demanda foi apresentada a representante da ONU após notícia sobre a redução do número de bombeiros no local.

A manutenção das buscas pelas 11 vítimas ainda não encontradas em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte, foi a principal demanda apresentada pelos familiares a Jan Jarab, representante na América do Sul do Alto Comissariado das Nações Unidas (ONU) para os Direitos Humanos.

Na tarde dessa quarta-feira (19/2/20), ele se encontrou com membros da associação que reúne familiares das vítimas, a Avabrum, em Brumadinho. E ouviu deles a informação de que o efetivo de bombeiros empregado nas buscas será reduzido, quando se esperava um aumento de militares após o período de chuvas.

Jan foi acompanhado dos parlamentares petistas André Quintão e Beatriz Cerqueira, que integram o grupo de trabalho formado pela Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG) para acompanhar os desdobramentos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Barragem de Brumadinho.

Pela manhã ele se reuniu também com a equipe técnica do ALMG para conhecer os detalhes da tragédia e os resultados da CPI. A Mina Córrego do Feijão se rompeu em janeiro de 2019, matando 272 pessoas, entre as quais dois nascituros. Uma das conclusões da CPI é que a mineradora Vale sabia dos riscos de rompimento.

André Quintão reforçou que vai conversar com o comando dos Bombeiros para entender as restrições e buscar alternativas. Beatriz Cerqueira também garantiu empenho para que as buscas continuem. Segundo ela, o governador Romeu Zema (Novo) se reuniu com as famílias em janeiro e prometeu aumento do efetivo após as chuvas.

Risco de contaminação justificaria redução de militares

A justificativa do Corpo de Bombeiros, segundo as famílias, é que boa parte do efetivo do Estado já atuou nas buscas pelo ciclo máximo de 21 dias e não pode retornar, sob risco de contaminação. Mas como a lama está seca, os parentes acreditam que esse ciclo pode ter o prazo revisto.

“Já tivemos quase 150 bombeiros aqui. Hoje temos 46 e recebemos a informação de que esse número será reduzido para 30 nos próximos meses”, detalhou Natália de Oliveira, irmã de Lecilda Oliveira, vítima ainda não localizada. Depois de 391 dias da tragédia, sua angústia é visível.

Ela teme que a operação seja suspensa, com o índice de 96% de localização das vítimas, o que já seria um “sucesso”. “Esses 4% restantes, porém, não são só números. Somos nós, com uma ferida aberta, que vivemos uma tragédia dentro da tragédia”, clamou.

Natália também pediu a Jan Jarab que busque em outros países tecnologias diferentes das utilizadas em Brumadinho, além de cães treinados que possam fazer novas buscas. Ele iniciou imediatamente os contados e já recebeu indicações sobre buscas realizadas na Guatemala e no México.

Geraldo Resende, pai de Juliana Resende, ainda não localizada, também relatou o drama de “amanhecer e anoitecer com a tragédia na cabeça”. Aos prantos e constrangido por chorar, ele pediu punição para os culpados.

Juliana deixou gêmeos que hoje têm um ano e dez meses. O marido dela também morreu na tragédia. “Eu olho para as crianças e não sei se estarei vivo para dar a elas o que dei à minha filha: educação e humildade. E a empresa enterrou ela viva”, lamentou. Outros familiares também estiveram no encontro.

Luta – As bandeiras da Avabrum foram apresentadas por Andresa Rodrigues, que perdeu o único filho, Bruno, na tragédia. “Queremos encontrar os corpos de nossas joias; alteração nas leis para que não haja novas mortes em nome do lucro; cadeia para os assassinos; a construção do memorial da tragédia; e uma reparação verdadeira”, enumerou.

Caso é emblemático, afirma Jan Jared

O representante da ONU afirmou que a instituição pode dar visibilidade a demandas ou mesmo pressionar por soluções em casos como o de Brumadinho, que ele considera emblemático. “A voz das vítimas é fundamental. Qualquer solução tem que ser centrada nas vítimas”, afirmou.

Para Jan Jared, os relatos dos familiares se assemelham aos de outros que perderam entes queridos em situações como violência militar, por exemplo. Segundo ele, o México, país onde atuou nos últimos quatro anos, tem 40 mil desaparecidos, e os pais seguem em busca de seus filhos mesmo após décadas.

“As narrativas coincidem sobre a importância de se enterrar os entes queridos para fechar simbolicamente o processo e viver o luto. Isso é entendido como um direito humano. Caso contrário, a dor é constante”, definiu.